Nosso Rio Guri

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sexta-feira, 24 de agosto de 2018

Fonte Dona Josefina no caminho dos viajantes

Uma viagem no tempo e pelos caminhos do Rio Grande, aqui do Sul.
Uma história que passa, também, pelas águas do Rio Guri. Vamos ver por quê.
A história do Rio Grande do Sul está ligada ao tropeirismo uma vez que, para ter acesso e assegurar as terras da região foi necessária a formação de tropas cujo objetivo, inicialmente, era garantir a posse na luta contra os espanhóis, e, consequentemente, a subsistência dos povoados que iam surgindo, se efetivando o comércio com os mercados de Laguna e de São Paulo. Os negócios da erva mate, charque, produtos agrícolas primários e utensílios, além do pastoreio do gado bovino fez do tropeirismo a importante atividade econômica nos séculos XVII a XIX. Assim iniciaram os caminhos do Rio Grande, através dos trajetos dos tropeiros, que abriam picadas, seguiam curso dos rios e atravessavam os campos num período de semanas. O local de pouso deveria garantir abrigo e água para os homens e animais. O fogo de chão garantia a alimentação e aquecia nos tempos de inverno rigoroso. Esses locais, pela história, se transformaram em povoamento dando origem às muitas das cidades atuais.
Desta forma surgiram aqui no sul os Caminhos da Praia (atual BR 101), dos Campos de Lages, de Viamão, da Serra, das Missões, Sacramento e outros. Esses são os caminhos pioneiros, conhecidos e estudados, que se transformaram em estradas, assim como os principais rios eram os caminhos de andanças pelas águas, num movimento que durou desde meados do Século XVII até o início do Século XX, quando se firmaram os novos meios de transportes.
Mas, também, haviam os caminhos secundários por onde, certamente, tropeiros, carreteiros viajantes, suas famílias e empregados se embrenhavam por estas terras, pelos campos com coxilhas (colinas), capões e banhados, da hoje conhecida Canoas. Terra onde se assentou a família de um dos primeiros tropeiros que aqui chegaram, o conquistador e povoador Francisco Pinto Bandeira.  Alguns autores chamam sua paragem de Guaixim - Sapucaia, onde ficava a sede da Fazenda do Gravataí, na Colina do Abílio, hoje bairro Estância Velha.Um local estratégico com ampla visão para os lados de Porto Alegre e para as várzeas dos rios da região, cujas características naturais certamente chamou a atenção destes viajantes.
“... a história do início do tropeirismo, tal qual seu apogeu, considerado pela historiografia atual como sendo os séculos XVIII e a primeira metade do XIX, esteve inter-relacionada a feições físicas características de cada região... ...graças as suas especificidades geológicas e biológicas, tornaram-se um importante ponto de apoio aos viajantes. (Entre mio-mios e embiras: homens e animais no caminho das tropas, pg 26)
Neste sentido este artigo busca destacar especificamente a nascente a beira da estrada que se firmou na região, neste período: a Estrada da Aldeia, sendo caminho de viajantes e tropeiros entre a Aldeia dos Anjos (Gravataí) e outras partes do país. Através do Passo das Canoas escoavam mercadorias pelos rios locais, principalmente o cultivo da mandioca e a exportação de farinha, contribuindo para o desenvolvimento da região.
Com a criação dos quatro primeiros municípios no estado do Rio Grande do Sul – Porto Alegre, Santo Antonio da Patrulha, Rio Grande e Rio Pardo, no início do Século XVIII a Aldeia dos Anjos, atual cidade de Gravataí, abraçava nos arredores, hoje as cidades de Canoas, Esteio, Cachoeirinha, Santa Rita, passando a ser distrito de Porto Alegre. Intenso eram por seus caminhos o trânsito de carretas de mercadorias entre a região, o Litoral e a Serra. E a Fonte na Estrada da Aldeia, atual Avenida Santos Ferreira, provavelmente recebia estes viajantes em suas paradas, proporcionando boa água ali existente e descanso.
Salientamos a importância de marcar e ampliar esta parte da história local, desta Fonte, da Cidade, da Região e do Estado, como espaço escolhido pelo povoador para morada, e tendo ainda como marco o cuidado ambiental de Lorenço Rosa ao criar em 1904 a proteção da nascente que ainda resta na chamada  fonte Dona Josefina.
A memória da parada dos viajantes na Fonte está registrada na produção historiográfica Canoas- Para Lembrar Quem Somos: Estância Velha. Nesta obra Noely Soares, o seu Neno, conta como funcionava o acampamento dos carreteiros ali na fonte, onde sesteavam, davam água para os bois e até pernoitavam, quando negociavam com o matadouro que se instalou nos seus arredores. Isso por volta de 1925, onde hoje é a Capatazia da Prefeitura. Nesta época, já se caracterizava como o final do tropeirismo, afirmado neste livro, com o advento das ferrovias e estradas e caminhões. O que firmou o início da história de Canoas. Entre outros relatos sobre esta fonte histórica, está o do Cônego Engilberto Hartmann contando que, no início do Século XX, quando seus avós iam de Taquari para o litoral, de carroça, passavam pela Estância Velha. Ele conta que esse era o caminho mais curto para a praia (veja mapa abaixo), e a Fonte Dona Josefina era o terceiro local de pernoite do grupo. “Dali eram mais 3 dias até Tramandaí” (1997).
E o projeto do Rio Guri tem orgulho de ter recebido em 2013, das mãos do saudoso poeta local Etevaldo Silveira, os versos sobre a Fonte Josefina que descrevem poeticamente essa jornada dos viajantes, reforçando o espaço da fonte como patrimônio natural e histórico.

Fontes bibiográficas:
PENNA, Rejane (Org). Canoas – Para Lembrar quem somos: Estância Velha. Canoas: Tecnicópias Gráfica e Editora, 1997.
http://www.revistas2.uepg.br/index.php/ahu/article/view/8753 - ENTRE MIO-MIOS E EMBIRAS: HOMENS E ANIMAIS NO CAMINHO DAS TROPAS

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